O assessor especial da Presidência da República para assuntos internacionais, Celso Amorim, alertou, em entrevista à CNN Brasil, para o risco real de uma guerra mundial diante da escalada simultânea de dois dos principais conflitos globais: a guerra entre Rússia e Ucrânia e a tensão crescente no Oriente Médio, especialmente entre Israel, Irã e Estados Unidos.
“Estamos vivendo um momento perigoso pelas partes envolvidas e perigoso para o mundo, porque há duas guerras com potencial de se alastrarem. Se essas duas guerras se comunicarem, teremos praticamente uma guerra mundial. Não digo uma guerra total, mas uma guerra com grande irradiação negativa, com reflexos na economia, no preço do petróleo”, afirmou Amorim.
O momento mais tenso da diplomacia global
Aos 83 anos, com mais de seis décadas de atuação diplomática, Amorim afirmou que o atual cenário geopolítico é o mais perigoso que já presenciou, superando inclusive momentos críticos da Guerra Fria, como a crise dos mísseis de Cuba.
“Mesmo na crise dos mísseis, havia duas pessoas podendo se comunicar. Agora, são muitos atores e muito incontroláveis”, alertou.
Para o diplomata, a presença de fatores religiosos no contexto atual aumenta ainda mais a complexidade e o risco da situação. “Em todo o Oriente Médio, vemos manifestações nos países islâmicos. E quando essa conotação religiosa desperta, é difícil conter”, observou.
Críticas ao ataque dos EUA ao Irã
Amorim também condenou veementemente o recente ataque dos Estados Unidos a três instalações nucleares iranianas, ocorrido no sábado (21). Segundo ele, a ação representou uma violação clara do direito internacional.
“A Carta da ONU não contempla essa história que Israel invoca de autodefesa preventiva. Isso não existe. É uma quebra total das normas internacionais e isso está ocorrendo com frequência”, criticou.
Ele lembrou que o Brasil participou, há 15 anos, de negociações diplomáticas com o Irã ao lado da Turquia, e que o país persa havia aceitado condições para desenvolver um programa nuclear pacífico. No entanto, com o fracasso do processo diplomático, o Irã acabou retomando o enriquecimento de urânio.
“Essa ideia de que o Irã pode ter a bomba em seis meses eu ouvi em 2010, e isso não ocorreu. Nada justifica esse bombardeio”, disse.
Apesar da gravidade do cenário, Amorim acredita que os Estados Unidos não tinham intenção original de atacar, mas foram “induzidos pela situação”.
Papel do Brasil e dos Brics
A crise internacional também deve ter reflexos na próxima Cúpula dos Brics, que ocorrerá no Rio de Janeiro nos dias 6 e 7 de julho. Amorim afirmou que o conflito pode entrar na pauta das discussões entre os países-membros que incluem, além do Brasil, Rússia, China, Índia, África do Sul, Irã e outras nações recém-integradas.
Contudo, ele ponderou que os Brics não têm uma posição homogênea sobre o tema e que ainda não está claro como o grupo poderá atuar diante da situação. “Talvez os Brics, em conjunto, possam fazer algo, mas não sei se haverá acordo”, afirmou.
Solução: Zona Livre de Armas Nucleares
Amorim concluiu defendendo a proposta egípcia de criação de uma zona livre de armas nucleares no Oriente Médio como única solução viável para reduzir as tensões na região. “O Irã não vai desistir de ter um programa nuclear pacífico. A única saída é a proposta do Egito”, reforçou.
Com um cenário cada vez mais instável e múltiplos focos de tensão geopolítica, o alerta do principal assessor internacional do governo brasileiro ecoa como um chamado à diplomacia global para evitar que o mundo mergulhe em um novo e catastrófico conflito.
Por João Vitor Mendes | Revisão: Daniela Gentil
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