O dólar voltou a disparar no mercado brasileiro nesta quinta-feira (10) e atingiu a cotação de R$ 5,6213 na máxima do dia, após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciar a imposição de uma tarifa de 50% sobre todas as exportações do Brasil para o território norte-americano. A decisão, com efeitos a partir de 1º de agosto, gerou forte reação nos mercados e acendeu um novo sinal de alerta nas relações comerciais entre os dois países.
Por volta das 12h20, a moeda americana operava em alta de 0,87%, cotada a R$ 5,5509. Já o Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores brasileira, recuava 0,70%, aos 136.352 pontos, pressionado sobretudo pela queda das ações da Embraer, que acumulavam perda de mais de 8% diante da perspectiva de prejuízos com a nova tarifa.
Na véspera, o dólar já havia avançado 1,06%, fechando a R$ 5,5032, enquanto o Ibovespa caiu 1,31%, a 137.481 pontos. Com os movimentos desta quinta, o acumulado do dólar na semana chega a -2,68%; no mês, -0,99%; e no ano, alta de 14,30%.
Tarifação atinge em cheio produtos estratégicos
A tarifa anunciada por Trump atinge indistintamente todos os produtos brasileiros exportados aos EUA, mesmo aqueles que já enfrentam cobranças elevadas, como aço e alumínio. Entre os principais itens afetados estão petróleo, carne bovina, café, minério de ferro e produtos industrializados de alto valor agregado, o que tende a gerar impactos significativos em setores estratégicos da economia brasileira.
Um levantamento da XP Investimentos apontou que a Embraer é uma das companhias brasileiras mais expostas às exportações para os EUA, com 23,8% de sua receita vinda daquele país. Também estão na lista empresas como Suzano (16,6%), Tupy (13,9%), Jalles Machado (11%) e Frasle Mobility (10,8%).
Justificativa política e menção a Bolsonaro
Na carta enviada ao governo brasileiro, Trump citou diretamente o ex-presidente Jair Bolsonaro, criticou o julgamento do político no Supremo Tribunal Federal (STF) e classificou o caso como uma “vergonha internacional”. O conteúdo da carta reforçou o tom político da medida tarifária e foi interpretado por analistas como um gesto deliberado de pressão e ingerência.
“Não seria a primeira vez que os EUA usam tarifas como ferramenta política”, afirmou o economista Paul Krugman, vencedor do Prêmio Nobel, em entrevista à imprensa internacional.
Ainda segundo Trump, a decisão seria uma resposta às “barreiras comerciais injustas” impostas pelo Brasil e ao “déficit insustentável” gerado pelo comércio bilateral. A alegação, no entanto, contrasta com os dados oficiais do Ministério do Desenvolvimento do Brasil, que mostram sucessivos déficits comerciais do país com os EUA desde 2009.
Lei da Reciprocidade
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva respondeu imediatamente à medida, afirmando que o Brasil não aceitará pressões ou tutela de nenhum país e prometeu acionar a Lei da Reciprocidade Econômica, que prevê retaliações tarifárias a nações que elevem tributos sobre exportações brasileiras.
A legislação foi aprovada pelo Congresso em 2019, em resposta à política protecionista adotada por Trump em seu primeiro mandato, e permite ao Brasil estabelecer tarifas equivalentes às impostas por outras nações.
Trump, porém, incluiu na carta um aviso direto ao governo brasileiro: caso o Brasil reaja com novas tarifas, os Estados Unidos aumentarão ainda mais os impostos sobre os produtos brasileiros. Em contrapartida, o republicano também abriu uma brecha para negociação, sugerindo que o Brasil elimine suas barreiras comerciais ou estimule que empresas brasileiras passem a fabricar seus produtos em solo norte-americano, o que evitaria a nova tarifa.
Escalada global de tarifas
O movimento contra o Brasil faz parte de uma ofensiva mais ampla adotada por Trump desde o início da semana. Até esta quinta-feira, 22 países já haviam recebido cartas semelhantes com imposições tarifárias entre 25% e 50%. Além do Brasil, foram notificados países como Argélia, Filipinas, Iraque, Moldávia, Brunei, Sri Lanka e Líbia.
De acordo com os textos enviados, a medida visa “demonstrar a força e o compromisso dos EUA com seus parceiros comerciais” e pretende pressionar os países a renegociarem seus acordos comerciais com os Estados Unidos sob novos termos.
Impacto na inflação e juros
Economistas e analistas de mercado alertam que a nova rodada de tarifas pode agravar os efeitos inflacionários nos EUA e no mundo. Como grande parte dos setores industriais depende de insumos importados, o aumento dos custos pode ser repassado aos consumidores, pressionando os índices de preços e, consequentemente, as decisões dos bancos centrais.
Nos Estados Unidos, o risco de inflação mais alta pode fazer com que o Federal Reserve mantenha as taxas de juros elevadas por mais tempo, o que fortalece o dólar globalmente e afeta países emergentes como o Brasil, com impacto direto nos investimentos, no consumo e no crédito.
No Brasil, o cenário é ainda mais sensível. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de junho, divulgado nesta quinta-feira, registrou alta de 0,24%, com inflação acumulada de 5,35% nos últimos 12 meses acima do teto da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que é de 4,5%.
Diante do resultado, o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, terá que publicar uma nova carta aberta ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, explicando as razões do estouro da meta.
Incerteza no horizonte
A decisão de Trump é vista como mais um capítulo na escalada de tensões comerciais globais e deve ter efeitos duradouros sobre a economia brasileira. A incerteza sobre os desdobramentos da tarifa e a possibilidade de novas retaliações comerciais geram apreensão entre investidores, empresários e autoridades.
O mercado, que já reagia negativamente ao aumento da inflação e à instabilidade política interna, agora encara um novo desafio: lidar com o risco crescente de isolamento comercial e com os custos da perda de competitividade dos produtos brasileiros no exterior.
Por Alemax Melo I Revisão: Lorrayne Rosseti
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