O mundo perdeu, nesta sexta-feira (23), um de seus maiores observadores da alma humana e da Terra. Morreu em Paris, aos 81 anos, o fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado, consagrado internacionalmente por seu trabalho sensível e impactante, que retratou com maestria a dor, a resistência e a dignidade de povos ao redor do mundo. A morte foi confirmada pelo Instituto Terra, organização fundada por ele e por sua esposa e parceira de vida, Lélia Wanick Salgado e a causa não foi divulgada.
“Sebastião foi muito mais do que um dos maiores fotógrafos de nosso tempo. Ao lado de sua companheira de vida, semeou esperança onde havia devastação e fez florescer a ideia de que a restauração ambiental é também um gesto profundo de amor pela humanidade”, afirmou o Instituto Terra em nota publicada nas redes sociais.
Do interior de Minas à lente do mundo
Nascido em Aimorés, Minas Gerais, Salgado se formou em economia antes de descobrir a fotografia no início da década de 1970. Em 1973, se tornou fotojornalista independente, passando por agências renomadas como Sygma, Gamma e Magnum Photos, até fundar sua própria agência, Amazonas Images, junto com Lélia.
Com sua câmera em preto e branco, percorreu mais de 100 países documentando o trabalho de operários, a migração de povos forçados a abandonar suas terras, os impactos das guerras, e também a força silenciosa da natureza. Obras como “Outras Américas”, “Trabalhadores”, “Êxodos” e “Gênesis” se tornaram marcos da fotografia documental e humanitária.
A grandeza do fotógrafo também foi retratada no cinema. Em 2014, o documentário “O Sal da Terra”, codirigido pelo cineasta Wim Wenders e por seu filho, Juliano Ribeiro Salgado, foi aclamado pela crítica internacional, recebendo o prêmio especial do júri na mostra Um Certain Regard em Cannes e sendo indicado ao Oscar de Melhor Documentário.
Mas o legado de Sebastião Salgado não está apenas em imagens. Em 1998, ele e Lélia iniciaram um projeto de restauração ambiental na antiga fazenda da família, também em Aimorés. O que era pasto degradado deu lugar a uma floresta de mais de 600 hectares de Mata Atlântica regenerada, com a criação do Instituto Terra, a primeira Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) em processo de recuperação no país.
O projeto virou exemplo mundial de regeneração ambiental e símbolo do compromisso do fotógrafo com o planeta. A cada árvore plantada, Salgado reafirmava sua convicção de que a natureza e a humanidade estão profundamente conectadas.
Uma ausência presente
Em 2016, Salgado foi eleito membro da Academia de Belas Artes da França, onde também foi homenageado após sua morte. “Sua vida foi o poder da ação transformadora”, declarou a instituição.
Embora tenha enfrentado problemas de saúde decorrentes de uma malária adquirida nos anos 1990, segundo o jornal Folha de S. Paulo, a causa exata da morte não foi divulgada. A ausência de Sebastião Salgado é imensa, mas seu legado permanece vivo, pulsante e inspirador.
Sebastião Salgado partiu, mas deixou um mundo mais atento, mais sensível e, sobretudo, mais comprometido com a dignidade humana e a vida no planeta. Ele nos ensinou que a fotografia pode ser um grito de denúncia, um gesto de ternura e um chamado à transformação. E, talvez por isso, nunca deixaremos de vê-lo em cada rosto que sua lente registrou, em cada árvore que ajudou a plantar.
Por João Vitor Mendes | Revisão: Daniela Gentil