O Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários (GPIAAF) divulgou as suas primeiras constatações sobre o grave acidente com o Elevador da Glória, na última quarta-feira (03). O documento confirma que o cabo de ligação entre as duas cabines cedeu e os sistemas de freio, acionados imediatamente pelo “guarda-freio” — motorista do bondinho nº1 —, não foram capazes de impedir a descida descontrolada e a colisão, que resultou num total de 16 mortes.
A sequência do acidente
De acordo com a Nota Oficial do GPIAAF, o acidente foi classificado como “grave”, tendo como consequência o “descarrilamento”. O evento ocorreu às 18:04 (hora local) na Calçada da Glória, em Lisboa.
Segundo o relatório inicial, os bondinhos haviam iniciado a viagem após os procedimentos normais de coordenação entre os motoristas por volta das 18:03. “Alguns instantes após o início do movimento e quando não teriam percorrido mais de cerca de seis metros, as cabinas perdem subitamente a força de equilíbrio garantida pelo cabo de ligação que as une”, descreve o documento.
Imediatamente, o “guarda-freio” do bondinho nº 1 “acionou o freio pneumático bem como o freio manual”. Contudo, o GPIAAF afirma que “essas ações não tiveram efeito em suster ou reduzir a velocidade do veículo”. O bondinho nº 1, que estava no topo da calçada, “continuou em aceleração pelo declive”, descarrilando cerca de 170 metros depois, tombando e colidindo contra um edifício.
O bondinho nº 2, que estava na outra extremidade do percurso, junto à Avenida da Liberdade, recuou bruscamente, e só parou cerca de 10 metros depois.
Sistemas de segurança e manutenção
O relatório detalha que o sistema de segurança que corta a energia automaticamente em caso de perda de força no cabo funcionou conforme previsto. No entanto, os freios “não têm a capacidade suficiente para imobilizar as cabinas em movimento sem estas terem as suas massas em vazio mutuamente equilibradas através do cabo de ligação”.
Quanto à manutenção, a nota informa ainda que, “segundo as evidências observadas até ao momento, o plano de manutenção previsto estava em dia” e que na manhã do acidente “havia sido realizada a inspeção visual programada, a qual não detetou qualquer anomalia no cabo e nos sistemas de frenagem”. No entanto, o documento salienta um detalhe crucial: “A zona onde o cabo se separou não é passível de visualização sem desmontagem”.
O cabo em uso, do tipo 6x36SW-CF U 1960 ZZ L3 CRM, havia sido instalado há 337 dias, estando dentro de sua vida útil definida de 600 dias. Portanto, ainda tinha 263 dias restantes até sua substituição programada.
Próximos passos
Uma outra constatação feita pelo GPIAAF é a falta de clareza sobre a supervisão legal do equipamento. O relatório inicial afirma: “O ascensor não está na alçada da supervisão do Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P., não detendo neste momento a investigação informação fidedigna e confirmada sobre qual é o enquadramento legal do ascensor da Glória nem sobre qual é a entidade pública que tem a obrigação de supervisionar o funcionamento e segurança deste sistema de transporte público”.
A investigação do GPIAAF, que é independente do processo judicial que está ocorrendo em paralelo, irá se concentrar em diversos aspectos, incluindo o mecanismo de fixação do cabo, o projeto original do ascensor, a eficácia dos sistemas de freio, os procedimentos de manutenção, a formação dos técnicos e motoristas e o enquadramento legal de supervisão.
O GPIAAF prevê publicar um relatório preliminar dentro de 45 dias, sujeito a possíveis restrições do segredo de justiça do processo judicial. O relatório final, com a análise completa e conclusões sobre as causas, deverá ser publicado no prazo de um ano, conforme a legislação portuguesa.
Advertências importantes
O gabinete investigador reforça no final do documento, que “do conteúdo deste documento não podem ser retiradas quaisquer conclusões válidas quanto às causas do acidente”, considerando que a informação factual apresentada é incompleta. Além disso, deixa claro que sua investigação “tem como único objetivo contribuir para a melhoria da segurança através da prevenção de futuros acidentes ou da mitigação das suas consequências, não se destinando nem sendo conduzidas com vista ao apuramento de culpas ou à determinação de responsabilidades”.
A nota finaliza assim afirmando que “dos factos expressos nesta nota não se deve presumir culpa ou responsabilidade de qualquer organização ou pessoa envolvida na ocorrência”.
Por: Eduardo Carvalho – Correspondente do MD News em Portugal | Revisão: Daniela Gentil
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