Cinco estados brasileiros estão no centro das preocupações do governo federal e do setor produtivo após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciar que pretende aplicar uma tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados ao território americano. Caso a medida seja confirmada, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo e Rio Grande do Sul seriam os mais prejudicados.
Segundo dados da Câmara Americana de Comércio para o Brasil (Amcham), de janeiro a junho de 2025 esses cinco estados foram responsáveis por mais de 70% das exportações brasileiras aos EUA. Os impactos podem ser diretos nas indústrias locais, no comércio portuário e até no emprego regional.
A escalada nas tensões teve início em 9 de julho, quando Trump enviou uma carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, alegando que as exportações brasileiras causam “prejuízos econômicos” aos EUA. O líder americano ainda citou supostas perseguições contra seu aliado Jair Bolsonaro e restrições à liberdade de expressão no Brasil como justificativa para a medida. O governo brasileiro rebateu com firmeza e não descarta retaliar com tarifas semelhantes contra produtos americanos.
Principais Estados exportadores
Os estados que mais exportam para os EUA, segundo o levantamento da Amcham, são:
- São Paulo: US$ 6,4 bilhões (31,9% do total nacional)
Principais produtos: suco de frutas (como o de laranja), aeronaves, equipamentos florestais
- Rio de Janeiro: US$ 3,2 bilhões (15,9%)
Principais produtos: óleo bruto de petróleo, produtos semiacabados de ferro e aço, óleos combustíveis
- Minas Gerais: US$ 2,5 bilhões (12,4%)
Principais produtos: café não torrado, ferro gusa, máquinas de energia elétrica
- Espírito Santo: US$ 1,6 bilhão (8,1%)
Principais produtos: celulose, cimento, cal e materiais de construção
- Rio Grande do Sul: US$ 950,3 milhões (4,7%)
Principais produtos: tabaco, calçados e máquinas de energia elétrica
Com a tarifa de 50% imposta pelos EUA, os produtos brasileiros chegariam mais caros ao consumidor americano. Isso reduziria drasticamente sua competitividade, abrindo espaço para concorrentes de outros países. O impacto pode ser devastador para setores como o aeronáutico, agrícola, de bebidas e de manufaturados.
“Suco de laranja é substituível”, afirmou um empresário do setor, temendo que grandes redes americanas optem por fornecedores de países como México e Espanha, onde o produto pode chegar sem sobretaxas.
Portos também devem sofrer
A tarifa também ameaça afetar a logística de exportação, já que 90% dos produtos brasileiros são enviados por navio. Três estados com portos estratégicos estão entre os maiores exportadores: São Paulo (porto de Santos), Rio de Janeiro (porto de Itaguaí e RJ) e Espírito Santo (porto de Vitória). Somente o porto de Santos respondeu por um terço das exportações brasileiras para os EUA no primeiro semestre de 2025.
Com a redução no volume de exportações, esses portos podem registrar perda de receitas, impactando arrecadação municipal e estadual, além de afetar empregos no setor portuário.
Impactos sobre empregos e produção
A indústria brasileira que vende para os EUA poderá ter de buscar novos mercados consumidores, algo que não acontece do dia para a noite. Alternativas como Europa, América Latina e Ásia estão sobre a mesa, mas o impacto imediato será sentido na queda nas vendas, diminuição da produção e possível aumento do desemprego nas regiões afetadas.
Empresas de médio porte, mais dependentes das exportações para os EUA, já cogitam reduzir turnos e congelar contratações. “Não temos como absorver uma perda de 40% da nossa demanda externa sem fazer ajustes drásticos”, declarou um executivo do setor têxtil em Minas Gerais.
Produtos que o Brasil importa dos EUA
Além de exportar, o Brasil também importa fortemente produtos americanos, o que aumenta ainda mais a tensão em torno da possível retaliação. Entre os principais itens importados dos Estados Unidos estão:
- Máquinas e equipamentos industriais
- Partes de aeronaves e helicópteros
- Produtos químicos (incluindo defensivos agrícolas)
- Medicamentos e vacinas
- Combustíveis e lubrificantes
- Trigo e outros grãos para alimentação animal
- Software e tecnologia embarcada
Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, o Brasil importou US$ 21 bilhões em produtos americanos apenas no primeiro semestre de 2025. Um eventual aumento nas tarifas brasileiras sobre esses itens poderia encarecer insumos essenciais para a indústria nacional, pressionando ainda mais a inflação.
Tensão geopolítica
Trump também afirmou, em sua carta, que qualquer retaliação brasileira será respondida com novas tarifas adicionais. No texto, ele se referiu ao tratamento dado por autoridades brasileiras a plataformas de redes sociais americanas e fez duras críticas às decisões da Justiça brasileira. A carta cita diretamente o julgamento de Jair Bolsonaro, investigado por tentativa de golpe de Estado, como “injusto”.
O presidente dos EUA tem enviado correspondências semelhantes a outros líderes internacionais, com propostas de aumento de tarifas e revisão de acordos comerciais. O Brasil foi o país com a maior tarifa anunciada até o momento (50%), acima das impostas à China (35%) e ao México (30%).
Mesmo com o tom duro, Trump deixou aberta a possibilidade de diálogo no futuro.“Posso negociar com Lula em algum momento, mas não agora”, afirmou nesta sexta-feira (11).
O que vem pela frente?
Especialistas em comércio internacional consideram que o momento é delicado. O Brasil pode tentar resolver o impasse na Organização Mundial do Comércio (OMC), mas o processo é longo. Internamente, o governo já prepara uma lista de produtos americanos que podem ser tarifados em resposta. O Itamaraty também estuda ações diplomáticas coordenadas com parceiros sul-americanos e europeus.
Enquanto isso, governadores dos estados brasileiros mais afetados pressionam Brasília para que medidas emergenciais sejam adotadas. São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo já sinalizaram preocupação com os impactos em suas cadeias industriais e receitas portuárias.
Independentemente dos próximos passos, o cenário aponta para uma guerra comercial com efeitos reais sobre a economia brasileira, especialmente nos estados onde a ligação com o mercado americano é mais forte. A relação entre Brasil e Estados Unidos, marcada historicamente por altos e baixos, entra em mais um capítulo de tensão.
Por Alemax Melo I Revisão: Daniela Gentil
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