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Sancionada lei que reconhece o abandono afetivo como ilícito civil

Nova legislação passa a responsabilizar pais e responsáveis que se omitem do dever de garantir o sustento, o cuidado emocional e a convivência familiar

O presidente em exercício, Geraldo Alckmin, sancionou a Lei nº 15.240/2025, que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e caracteriza o abandono afetivo de crianças e adolescentes como ilícito civil. O texto foi publicado no Diário Oficial da União da última quarta-feira, 29 de outubro, e também leva as assinaturas dos ministros Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) e Macaé Evaristo (Direitos Humanos e Cidadania).

A nova lei reforça que o cuidado emocional e o convívio familiar são deveres jurídicos e sociais, e não apenas responsabilidades morais. Além do sustento material, pais e responsáveis devem zelar pela presença afetiva, acompanhamento psicológico, moral e social dos filhos.

Ao tipificar o abandono afetivo, o texto legal deixa claro que a omissão em prestar assistência emocional, moral, psíquica ou social configura descumprimento do dever de cuidado. A medida busca combater a negligência, a violência e o distanciamento emocional em núcleos familiares, reforçando que o vínculo afetivo também é essencial para o desenvolvimento integral.

O que muda com a nova lei?

Se o abandono afetivo já era reconhecido pela Justiça em alguns casos, a nova lei deixa de depender apenas da interpretação dos tribunais. Agora, o tema passa a constar expressamente no ECA como ilícito civil, o que fortalece o direito à convivência familiar e à assistência emocional.

Para compreender os impactos jurídicos e sociais da mudança, nossa reportagem ouviu as advogadas Ludimila Albuquerque, especialista em Direito de Família e Sucessões, e Cristiane Britto, especialista em Estatuto da Criança e do Adolescente.

Segundo Ludimila Albuquerque, o impacto da ausência parental é profundo e duradouro. “A ausência do pai ou da mãe fere a criança e o adolescente nos aspectos mais diversos da vida, causando um trauma eterno de abandono. Isso pode provocar dificuldade de aprendizado, medo, tristeza patológica, baixa autoestima e até abrir caminho para comportamentos de risco”, explica.

Ela destaca que o principal avanço da nova lei é consolidar um direito já reconhecido pela jurisprudência. O que a lei faz é tornar esse direito inquestionável. Antes era preciso discutir se o abandono afetivo poderia gerar dano moral. Agora, comprovado o abandono, discute-se apenas o valor da indenização cabível”, afirma.

Cristiane Britto reforça que o texto legal traz segurança jurídica e efetividade à proteção integral. “O abandono afetivo deixa de ser apenas uma construção dos tribunais e passa a estar previsto no próprio ECA. Isso dá base sólida para as decisões judiciais e torna o direito à convivência um dever jurídico claro”, detalha.

Como comprovar o abandono

As advogadas explicam que, embora o afeto seja subjetivo, o dever de convivência e cuidado é objetivo e pode ser demonstrado em juízo.

“A ausência de convivência pode ser comprovada por mensagens, e-mails, ligações – ou pela ausência deles – e também por testemunhos. O pai que busca o filho apenas para deixá-lo com terceiros, eximindo-se da convivência, pode ser responsabilizado”, detalha Ludimila Albuquerque.

Cristiane Britto acrescenta que o foco não é punir a falta de amor, mas a negligência consciente: “O que se busca provar não é a ausência de sentimento, mas a omissão no dever de cuidado. O vínculo emocional é parte do direito à proteção integral. Cuidar é obrigação legal, não favor”, expõe.

Como a criança pede socorro?

Para entender como esse abandono se manifesta na prática e quais são seus reais impactos no desenvolvimento infantil, ouvimos Priscilla Montes, educadora, especialista em Neuroeducação e desenvolvimento infantil, e também advogada.

Para a especialista, a negligência afetiva vai além da ausência física, se caracteriza pela indisponibilidade emocional do cuidador. “A negligência afetiva não é apenas ausência de presença física, mas ausência de presença emocional. É quando o adulto está fisicamente, mas não está disponível emocionalmente”, adverte.

Esse sentimento de rejeição raramente é verbalizado pela criança, que muitas vezes não possui capacidade neurológica para nomear o que sente. “Ela sente como se fosse uma dor física”, pontua a educadora.

Priscilla Montes alerta que o sofrimento emocional na infância costuma se expressar pelo corpo e pelo comportamento, e não pelo discurso. “Todo comportamento desafiador tem uma história. Todo silêncio é um pedido de ajuda”, afirma.

Ela lista alguns sinais clássicos e sutis que indicam insegurança afetiva:

  • Regressões comportamentais: voltar a fazer xixi na cama, chupar o dedo ou querer dormir com os pais novamente.
  • Alterações no sono e apetite: insônia, pesadelos, recusa alimentar ou comer compulsivo.
  • Oscilações de humor: irritabilidade, choro fácil, agressividade ou apatia.
  • Sintomas psicossomáticos: dores de cabeça, de barriga, enjoos recorrentes sem causa médica.
  • Queda no desempenho escolar: dificuldade de concentração, esquecimento, desmotivação.
  • Hipervigilância emocional: a criança “lê o ambiente” o tempo todo, tentando antecipar reações dos adultos.


Priscilla ressalta que a ausência de vínculo afeta diretamente o desenvolvimento cerebral.

“Do ponto de vista da neurociência, a ausência de validação emocional afeta o desenvolvimento do sistema límbico e do córtex pré-frontal, comprometendo a capacidade de autorregulação e a confiança básica no outro”, salienta.

Afeto é fator de proteção

A especialista enfatiza que, embora a nova lei seja um avanço, o cuidado emocional não depende de recursos financeiros, mas de conexão.

“É importante entender que o cuidado emocional não se resume à psicoterapia. Ele começa nas relações do cotidiano, em um ambiente emocionalmente seguro”, diz Montes.

Ela sugere práticas acessíveis que podem proteger a saúde emocional da criança, mesmo quando a família enfrenta limitações:

  • Rotina previsível e coerente: estabilidade dá segurança e reduz a ansiedade.
  • Escuta ativa: olhar nos olhos, validar sentimentos e nomear emoções (“eu entendo que você ficou triste porque…”).
  • Rede de apoio comunitária: escolas, igrejas, CRAS e projetos sociais podem orientar.
  • Tempo de qualidade: mesmo 10 minutos diários de atenção plena — sem celular — têm efeito regulador.
  • Brincar e movimento: o brincar livre reorganiza o sistema nervoso e ajuda na autorregulação.
  • Acolhimento escolar: professores podem ser pontes emocionais importantes.

“Nem toda família tem recursos, mas toda criança precisa de vínculos seguros. O afeto é o maior fator de proteção que o cérebro conhece”, conclui.

Por: Laís Queiroz | Revisão: Pietra Gomes

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Marcia Dantas

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