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Bullying, violência escolar e a repercussão de ‘Adolescência’

Lei existe, mas falha: por que o Brasil não consegue frear a violência escolar?

Nos últimos dias, a minissérie Adolescência (2025), da Netflix, tem dominado as discussões na internet. Criada e estrelada por Stephen Graham, a produção se baseia em um caso real de assassinato ocorrido na Inglaterra, no qual o principal suspeito é um menino de 13 anos. Mais do que um drama criminal, a minissérie levanta debates profundos sobre o papel da família, da escola e das redes sociais na formação dos jovens, além de abordar a influência desses fatores no comportamento de crianças e adolescentes.

Um dos temas centrais de Adolescência é o bullying, retratado de maneira crua e impactante. A série expõe como a violência psicológica e física entre crianças e adolescentes pode ter consequências devastadoras, afetando não apenas as vítimas, mas toda a comunidade ao seu redor. O roteiro não se limita a narrar os fatos, mas propõe uma reflexão sobre as raízes desse problema e a responsabilidade coletiva na sua prevenção.

7 de abril: um alerta sobre o bullying no Brasil

A discussão levantada pela série se torna ainda mais relevante no contexto brasileiro, especialmente com o Dia Nacional de Combate ao Bullying e à Violência na Escola, celebrado neste 7 de abril. A data não é apenas uma marca no calendário, mas um chamado à sociedade para refletir e agir contra um dos desafios mais urgentes do ambiente escolar. O bullying, em suas diversas formas – seja físico, psicológico ou virtual –, transcende os muros das instituições de ensino e se torna um fenômeno social com impactos profundos na vida dos indivíduos e na coletividade.

Um levantamento realizado pela DataSenado aponta que cerca de 6,7 milhões de estudantes sofreram algum tipo de violência na escola no último ano – o número representa 11% dos quase 60 milhões de estudantes matriculados no país. Considerando registros em cartórios, foram identificadas mais de 121 mil notificações em 2023.

As falhas da legislação no combate ao bullying

A erradicação do bullying não depende apenas da boa vontade dos indivíduos, mas também da implementação de políticas públicas eficazes. A Lei n° 13.185/2015, conhecida como Lei do Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying), estabelece diretrizes nacionais para a prevenção e enfrentamento dessa prática. Contudo, especialistas apontam que, apesar dos avanços legislativos, ainda há um longo caminho a percorrer para que essas diretrizes sejam plenamente aplicadas e fiscalizadas nas instituições de ensino.

O professor Lucelmo Lacerda, doutor em Educação e referência em inclusão escolar, reforça a necessidade de um esforço coletivo para erradicar essa prática. “O combate ao bullying exige mais do que discursos; é necessário um compromisso efetivo das escolas, das famílias e da sociedade como um todo para a construção de uma cultura de respeito e empatia.”

Lacerda também aponta algumas diretrizes essenciais para a identificação e mitigação do bullying:

1. Identificação precoce dos sinais

Mudanças de comportamento, isolamento social, queda no desempenho escolar e sintomas psicossomáticos podem ser indicativos de que algo está errado.

2. Adoção de práticas inclusivas

Incentivar a diversidade, criar espaços de acolhimento e promover atividades que estimulem o respeito e a empatia são medidas eficazes na prevenção do bullying.

3. Apoio às vítimas

Escuta ativa, acolhimento e acompanhamento psicológico são fundamentais para a superação dos impactos do bullying.

4. Responsabilização dos agressores

A conscientização e a reeducação dos agressores são passos essenciais para romper com o ciclo da violência.

Realengo e outras tragédias: o preço da negligência

A data de 7 de abril também remete a um dos episódios mais trágicos da história recente do Brasil. Em 2011, Wellington Menezes de Oliveira, um ex-aluno de 24 anos, invadiu a Escola Municipal Tasso da Silveira, no bairro de Realengo, no Rio de Janeiro, e matou 12 crianças, deixando outras 12 feridas.

Na manhã do ataque, ele se apresentou como palestrante convidado e entrou na unidade escolar portando dois revólveres. Wellington cumprimentou uma antiga professora antes de seguir para o segundo andar, onde invadiu uma sala de aula e começou a atirar. Testemunhas relataram que ele mirava na cabeça das meninas e no corpo dos meninos, disparando à queima-roupa. Após ser baleado por um policial, Wellington tirou a própria vida. Em uma carta deixada antes do ataque, ele mencionou ter sido vítima de bullying na escola.

O massacre de Realengo deveria ter servido como um alerta definitivo para políticas mais eficazes de prevenção à violência escolar, mas, desde então, o Brasil continuou acumulando tragédias:

Goiânia (2017)

Um aluno de quatorze anos, que cursava o oitavo ano do ensino fundamental no Colégio Goyases matou dois colegas e deixou outros quatro feridos. O motivo, segundo seu depoimento depois do crime, teria sido bullying, que vinha sofrendo por um de seus colegas. A arma utilizada no crime pertencia à sua mãe, que assim como o pai eram da corporação da Polícia Militar.

Suzano (2019)

Dois ex-alunos armados invadiram a Escola Estadual Raul Brasil, em São Paulo, e assassinaram cinco estudantes e duas funcionárias. Antes do ataque, os criminosos passaram meses consumindo conteúdos violentos na internet e sofreram bullying durante a adolescência.

Esses casos reforçam que o Brasil enfrenta uma crise de segurança nas escolas, agravada pela falta de suporte psicológico e medidas preventivas eficazes.

O que pode ser feito?

O combate ao bullying e à violência escolar precisa ir além de campanhas pontuais. O investimento em políticas públicas eficazes, capacitação de professores, fortalecimento do suporte psicológico nas escolas e a criação de um ambiente verdadeiramente inclusivo são passos essenciais.

Além disso, a influência das redes sociais não pode ser ignorada. Muitos dos jovens envolvidos em atos violentos buscam validação em comunidades extremistas online, o que demonstra a necessidade de um monitoramento mais eficaz e de campanhas de conscientização sobre os perigos do discurso de ódio e da radicalização digital.

Como solução para este dilema, Lacerda aponta a priorização das Práticas Baseadas em Evidências, abordagem com viés científico que possibilita a implementação de condutas pedagógicas das quais se conhece a eficácia a partir de pesquisas e estudos.

No Brasil, iniciativas como SaferNet trabalham com denúncias anônimas de discurso de ódio, mas a escala ainda é insuficiente. Plataformas como TikTok e Instagram têm algoritmos que amplificam conteúdos agressivos, mas também poderiam priorizar materiais educativos, como faz o YouTube com seu programa “Creators for Change” (focado em empatia digital).

O que o Brasil pode aprender com outros países?

Enquanto o Brasil patina na implementação de políticas antibullying, países como Finlândia colhem resultados com o programa KiVa, adotado em 90% das escolas públicas. Dados divulgados pelo próprio programa mostram que o KiVa reduziu o bullying em 79% das instituições em 10 anos, com base em treinamento de professores, monitoramento de casos e envolvimento dos alunos como “testemunhas ativas”. No Canadá, a Lei 13 (2012) exige que todas as escolas tenham planos de prevenção auditados anualmente, com metas claras. 

Em Portugal, a Lei n.º 51/2012 criou o Estatuto do Aluno e da Ética Escolar, estabelecendo princípios fundamentais para a convivência democrática e responsável no contexto educativo. No âmbito desta legislação, foi instituído o Gabinete de Ética Escolar (GEE), que atua em articulação com os demais intervenientes da comunidade escolar, acompanhando os alunos em matéria disciplinar. O GEE desempenha um papel essencial ao:

  • Acompanhar os alunos do ponto de vista disciplinar;
  • Promover a uniformização de critérios na aplicação de medidas corretivas e disciplinares;
  • Assegurar maior agilidade e eficácia na aplicação dessas medidas;
  • Prevenir e intervir em situações de violência escolar, com especial atenção ao combate ao bullying;
  • Fomentar uma cultura de respeito, tolerância e paz no ambiente educativo.

No Brasil, a implementação da Lei 13.185/2015 esbarra na falta de fiscalização. Dados do Instituto Sou da Paz (2022) mostram que menos de 5% dos casos graves de bullying em escolas públicas viram ações judiciais. 

Enquanto a sociedade não encarar o problema com a seriedade necessária, tragédias como Realengo, Suzano e tantas outras continuarão acontecendo. O que está em jogo não é apenas a segurança das escolas, mas o futuro de uma geração inteira.

Por: Laís Queiroz | Revisão: Camilly Barros

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