Um documento assinado por alguns dos principais pesquisadores do clima circulou com críticas severas ao rascunho das negociações da COP30. Para o grupo, as propostas que foram colocadas na mesa não atendem ao nível de ação exigido pela ciência e deixam sem resposta dois dos pontos centrais para conter o aquecimento global: o fim dos combustíveis fósseis e a interrupção definitiva do desmatamento.
A principal objeção dos cientistas recai sobre o “mapa do caminho” provisório , divulgado na terça (18), que deveria orientar a eliminação dos fósseis e do desmatamento. Em vez de apresentar metas e prazos, o texto oferece apenas duas possibilidades: a primeira é uma série de workshops para que países troquem experiências, e a segunda, uma rodada ministerial de alto nível para discutir direções gerais.
Segundo pesquisadores como Johan Rockström, essas alternativas não caracterizam um plano. “Um roteiro precisa mostrar como chegar ao destino, não apenas sugerir conversas”, afirmou. Negociadores relataram que as discussões avançaram pela madrugada da quarta-feira, mas seguem travadas por disputas geopolíticas.
Proposta alternativa da comunidade científica
Diante do impasse, os especialistas pretendem entregar à presidência da COP30 uma sugestão formal, que seria a criação de um painel científico encarregado de elaborar, até abril de 2026, um plano detalhado para eliminação gradual dos combustíveis fósseis. O tema será discutido na reunião marcada para a Colômbia em 2026, dedicada exclusivamente ao abandono dos fósseis.
A presidência da conferência também mantém encontros com grupos de pesquisa e organizações da sociedade civil, incluindo o Observatório do Clima. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa da agenda em Belém.
O que os cientistas consideram essencial
O grupo defende que o uso de petróleo, gás natural e carvão seja totalmente encerrado entre 2040 e 2045. Para viabilizar isso, o documento propõe quatro ações estruturais:
• Bloquear novos investimentos em combustíveis fósseis;
• Acabar com subsídios ao setor;
• Ampliar rapidamente a geração renovável;
• Garantir financiamento climático em volume suficiente para países em desenvolvimento.
O financiamento é apontado como componente crucial, já que muitas nações não têm condições de promover suas transições energéticas sem recursos adicionais, de preferência em forma de doações.
Florestas sob pressão
As florestas tropicais também aparecem entre as principais preocupações. Thelma Krug, presidente do Conselho Científico da COP30, alerta que ecossistemas cada vez mais vulneráveis podem deixar de absorver carbono e se tornar emissores. Secas prolongadas, incêndios e mudanças no uso da terra aceleram esse risco.
Por isso, os pesquisadores defendem que os planos para gases de efeito estufa e para florestas sejam integrados. Eles ressaltam ainda que manter as florestas em pé não pode ser tratado como permissão para continuar queimando fósseis.
Destacam também que combater o desmatamento requer financiamento, monitoramento e capacitação. Além disso, grande parte das florestas intactas está em países pobres, o que demanda cooperação internacional.
Janela para reduzir emissões fecha em 2026
Outro alerta foi feito por Piers Forster, da Universidade de Leeds. Ele afirma que as emissões globais devem começar a cair a partir de 2026 e que o CO2 de origem fóssil precisa ser reduzido em pelo menos 5% ao ano para evitar danos severos.
O documento reforça ainda que o orçamento global de carbono para manter viva a meta de 1,5°C está praticamente esgotado: restariam cerca de 130 bilhões de toneladas de CO₂, equivalente a apenas três ou quatro anos de emissões globais no ritmo atual. Apagar esse conceito do texto final, como sugerem alguns países produtores de petróleo, seria “negar a realidade da conferência”, dizem os pesquisadores.
Quem assina o texto
• Carlos Nobre (Science Panel of the Amazon)
• Fatima Denton (ONU)
• Johan Rockström (Potsdam Institute for Climate Impact Research)
• Marina Hirota (Instituto Serrapilheira)
• Paulo Artaxo (USP)
• Piers Forster (University of Leeds)
• Thelma Krug (Conselho Científico da COP30)
Por Marília Duarte | Revisão: Daniela Gentil
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