O Nepal vive uma das piores crises políticas de sua história recente. O primeiro-ministro KP Sharma Oli, de 73 anos, anunciou nesta terça-feira (9) sua renúncia ao cargo, pressionado pelos protestos massivos que se espalharam pelo país contra o bloqueio de redes sociais e denúncias de corrupção no serviço público.
A decisão foi tomada após uma escalada de violência que deixou 25 mortos em confrontos entre manifestantes e forças de segurança. Milhares foram às ruas de Katmandu e outras cidades, enfrentando a repressão policial, que incluiu o uso de gás lacrimogêneo, balas de borracha e até munição letal, segundo denúncia da Anistia Internacional.
Em sua carta de renúncia, dirigida ao presidente, Oli afirmou ter deixado o cargo “com o objetivo de dar novos passos em direção a uma solução política e à resolução dos problemas”. O líder, em seu quarto mandato à frente do governo, já enfrentava desgaste político com a instabilidade interna, baixo crescimento econômico e críticas à corrupção, mas o bloqueio às redes sociais foi o estopim da revolta popular.
Redes bloqueadas e juventude nas ruas
A crise começou na última quinta-feira, quando o governo determinou o bloqueio de 26 plataformas, incluindo Facebook, X (antigo Twitter), YouTube e LinkedIn, que não haviam feito registro legal junto às autoridades. O tema já havia sido discutido pela Suprema Corte em 2023, mas as empresas não cumpriram as exigências.
A medida gerou forte reação entre os jovens, que representam 43% da população do Nepal. O TikTok, que não foi bloqueado, tornou-se o principal espaço de mobilização, com vídeos denunciando a disparidade entre a vida de luxo dos filhos de políticos e as dificuldades enfrentadas pela população.
“Não se trata apenas de redes sociais, trata-se de confiança, corrupção e de uma geração que se recusa a ficar em silêncio”, destacou o jornal Kathmandu Post.
Escalada de violência e tragédia
Os protestos tomaram dimensões dramáticas na segunda-feira, quando milhares cercaram o Parlamento em Katmandu. O prédio foi incendiado por grupos radicais, assim como a Suprema Corte e residências de políticos.
Uma das vítimas foi Rajyalaxmi Chitrakar, esposa do ex-primeiro-ministro Jhalanath Khanal. Ela morreu após a casa da família ser incendiada em Dallu, região nobre da capital. Segundo autoridades, a mulher foi trancada no imóvel antes de o fogo ser ateado. Levado em estado crítico ao Hospital de Queimados de Kirtipur, não resistiu às lesões.
A violência também atingiu o setor aéreo. O aeroporto internacional de Katmandu suspendeu operações devido à fumaça e invasões, enquanto voos domésticos foram interrompidos. Em Bhairahawa, manifestantes invadiram o terminal próximo à fronteira com a Índia e incendiaram veículos do governo.
Governo recua
Diante da pressão, o governo anunciou nesta terça-feira a suspensão da proibição às redes sociais. O ministro da Comunicação, Prithvi Subba Gurung, classificou a medida como uma resposta a uma das “principais demandas da Geração Z”.
Apesar da renúncia do premier e do recuo nas restrições, a situação segue instável, com cenas de vandalismo e violência em diferentes pontos do país. Analistas apontam que o governo interino terá de lidar com um cenário delicado, que combina revolta popular, crise política e um forte desafio à governabilidade no Himalaia.
Por João Vitor Mendes | Revisão: Daniela Gentil
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