A esperança de milhares de brasileiros tem nome: transplante. Para cada paciente, essa palavra representa uma história única: a de um coração que volta a bater com força, a de um rim que traz liberdade e a de uma córnea que devolve a visão. Em 2024, essas histórias se multiplicaram pelo Brasil: o país bateu recorde histórico de transplantes realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), ultrapassando a marca de 30 mil procedimentos, um crescimento de 18% em relação a 2022.
O resultado reforça o papel do Brasil como o país que mais realiza transplantes em sistema público de saúde no mundo. O anúncio foi feito pelo Ministério da Saúde, que também apresentou um conjunto de medidas para modernizar o Sistema Nacional de Transplantes (SNT) e tornar as doações mais ágeis e seguras.
“Quero dividir essa conquista com todos os profissionais que se dedicam a fortalecer o SUS — médicos, enfermeiros, técnicos, equipes do SAMU e gestores estaduais e municipais. É uma vitória coletiva e uma reafirmação do Brasil como referência mundial em transplantes públicos”, destacou o ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
Tecnologia e eficiência: a nova era dos transplantes
Entre as novidades anunciadas está a Prova Cruzada Virtual, que será incorporada à rede pública. O exame cruza informações imunológicas de doadores e receptores previamente armazenadas em um sistema, o que reduz o tempo entre a doação e a cirurgia e diminui o risco de rejeição.
Hoje, o SUS utiliza a Prova Cruzada Real, feita com amostras físicas de sangue. Com a versão virtual, o processo se torna mais ágil: apenas os pacientes compatíveis serão chamados para o exame presencial. Isso significa menos deslocamentos, mais precisão e maior aproveitamento dos órgãos disponíveis.
“Investir em transplantes é salvar vidas, mas também é melhorar a qualidade de todo o atendimento hospitalar. As medidas que estamos adotando vão reduzir o tempo de espera e qualificar a rede de saúde em todo o país”, explicou Padilha.
Mudanças na distribuição de órgãos
Outra medida importante é a reorganização das regiões de alocação dos órgãos. A partir de agora, a prioridade será a distribuição entre estados da mesma região geográfica, garantindo maior rapidez e aproveitamento dos órgãos disponíveis.
Caso não haja receptor compatível na região, o órgão será encaminhado à lista nacional.
Essa atualização leva em conta o novo cenário logístico do país, com mais voos e novos centros de transplantes em diversos estados, além do apoio da Força Aérea Brasileira (FAB) para o transporte rápido dos órgãos.
Avanços inéditos: transplante de intestino e uso de membrana amniótica
O Ministério da Saúde também anunciou a inclusão do transplante de intestino delgado e multivisceral no SUS, um procedimento de alta complexidade destinado a pacientes com falência intestinal irreversível, condição que impede o intestino de absorver nutrientes.
Antes restrito a poucos países, o procedimento agora é oferecido gratuitamente na rede pública, com hospitais habilitados no Rio de Janeiro e em São Paulo. A medida coloca o Brasil entre as nações com maior diversidade de transplantes ofertados em sistema público.
Outra novidade é o uso da membrana amniótica como curativo biológico para o tratamento de queimaduras. Estudos indicam que o método reduz o tempo de cicatrização, infecções e dor, proporcionando um tratamento mais humanizado.
Mais acolhimento para famílias e incentivo à doação
Mesmo com o recorde de transplantes, ainda há 78 mil pessoas na fila por um órgão, sendo 42 mil por rim, 32 mil por córnea e 2,3 mil por fígado. Para ampliar o número de doações, o Ministério da Saúde lançará o Programa Nacional de Qualidade em Doação para Transplantes (ProDOT).
A iniciativa prevê a capacitação de equipes de saúde para acolher melhor as famílias e reduzir as negativas de autorização para doação, que hoje chegam a 45% — bem acima da média de países como a Espanha, onde a taxa é de apenas 8% a 10%.
“Estamos mudando a maneira de olhar a doação. Para aumentar o número de transplantes, precisamos aumentar o número de doadores. E isso começa com o acolhimento das famílias”, explicou Patrícia Freire, coordenadora-geral do Sistema Nacional de Transplantes.
Ela lembra que o processo só é possível com o consentimento da família, mesmo que a pessoa tenha manifestado o desejo de ser doadora em vida.
Mais de 85% dos transplantes são financiados pelo SUS
A força do sistema público é evidente nos números: mais de 85% dos transplantes no país são financiados pelo SUS. O cuidado, no entanto, vai muito além da cirurgia. O sistema garante o acesso gratuito e contínuo aos medicamentos imunossupressores, essenciais para evitar a rejeição do órgão e que acompanham o paciente por toda a vida.
Por: Laís Queiroz | Revisão: Daniela Gentil
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