A maior parte dos casos acontece dentro de casa e geralmente por falta de informação
Dados do Boletim Epidemiológico 2025 da Sociedade Brasileira de Salvamento Aquático (Sobrasa), lançado nesta semana, apontam que 16 pessoas morrem afogadas por dia no Brasil, o equivalente a uma morte a cada 90 minutos. Desse total, quatro são crianças e duas adolescentes. Outras duas são testemunhas que tentaram salvar vítimas de afogamento sem ter conhecimento. O mais alarmante, contudo, é que 54% dos casos envolvendo menores de 9 anos ocorrem dentro de casa.
A falta de informação sobre riscos de afogamento e medidas preventivas é apontada por especialista como uma das principais responsáveis pelo alto número de vítimas. Para conscientizar as pessoas sobre isso, o Brasil vai celebrar, no próximo 14 de abril, o primeiro Dia Nacional de Prevenção ao Afogamento Infantil, instituído em julho do ano passado pela Lei número 14.936/2024.
O levantamento da Sobrasa, elaborado com informações do DataSUS referentes ao ano-base 2023 (último dado disponível), indica que 5.883 pessoas morreram afogadas em todo país, sendo que em 42% dos casos as vítimas tinham menos de 29 anos. A faixa etária com maior número de afogados é de 15 a 24 anos. O número de mortes desse estudo superou o do ano anterior, quando foram registrados 5.448 casos. Outras 609 foram internadas em consequência de traumas de mergulho em águas rasas.
O estudo mostra que, do total de mortes, 76% aconteceram em rios, lagos e represas e atingiram 42% dos 5.570 municípios brasileiros, num total de 2.342 cidades. Esse é o caso dos irmãos João Miguel e Ísis Tessália Pereira da Silva, de 9 e 11 anos, respectivamente, que no último dia 16, foram arrastados pela correnteza quando brincavam com outras duas crianças, de 10 e 14 anos, nas águas do rio Paraopeba, na região de Papagaios, Minas Gerais.
A prima das crianças, Karol Oliveira, conta que o padrasto delas, sem saber nadar, conseguiu salvar os outros dois menores próximos da margem do rio, mas os irmãos caíram em uma parte mais funda e desapareceram. Os corpos foram encontrados por pescadores três dias depois.
NÃO É ACIDENTE
Segundo o médico David Szpilman, secretário-geral da Sobrasa, afogamento não ocorre por acidente nem por acaso. “Ele tem prevenção em 99% dos casos e só acontece por negligência, supervalorização das condições físicas de quem sabe nadar ou subestimação de risco do local do mergulho. Por isso o classificamos de incidente”, explica.
O médico diz que o risco de morte por afogamento é duzentas vezes maior que ao volante de um carro, principalmente em relação a crianças e adolescentes, por eles serem mais vulneráveis e se arriscarem mais. Ele explica que uma lâmina d’água, equivalente a três dedos, já é suficiente para matar uma criança em um piscar de olhos. “O afogamento é silencioso e rápido”, alerta.
O boletim epidemiológico da Sobrasa mostra ainda que, em média, os homens morrem seis vezes mais que as mulheres e que afogamento é a segunda causa de morte de crianças na faixa de 1 a 4 anos e a quarta nas de 5 a 9 anos. Além disso, 99 de cada 100 vítimas resgatadas morrem antes de chegar ao hospital. Cada afogamento custa ao Brasil, segundo o estudo, R$ 200 mil.
Outro dado surpreendente do levantamento é que a cada dois dias um turista brasileiro morre afogado em outro estado. A maioria, 82%, são de Minas, seguida de São Paulo (17%) e Paraná (15%). As mortes acontecem com maior frequência no Espírito Santo (19%), Bahia (17%) e Santa Catarina (2,6%)
NADAR COMO TUBARÃO
Com apenas 10 anos, o estudante da quinta série Davi Assef é referência em prevenção de afogamentos e faz até palestras para adultos. Ele é responsável pela criação da primeira plataforma online com dicas, jogos, vídeos e orientações de prevenção de afogamento para crianças. Trata-se da TubaGo (www.tubago.com.br), em alusão ao tubarão que segue nadando. Davi faz natação desde os seis meses e teve a ideia desse suporte de tanto ouvir falar em afogamento e se preocupar com os riscos enfrentado por pessoas que não sabem nadar.
O publicitário Henry Assef, pai de Davi, que administra a plataforma junto com o filho, conta que o filho nasceu com trauma de água por conta de banhos recebidos na maternidade de forma errada e era muito difícil acalmá-lo na hora do banho. “O Davi não deixava a água bater no rosto dele e chorava muito. Então o colocamos na natação para perder o medo e, depois de muitas lágrimas, ele acabou se soltando e hoje até participa de campeonatos”, comemora. Segundo Henry, o filho idealizou a criação da plataforma quando tinha apenas 6 anos, ao vencer um concurso de ideias para um mundo melhor, disputando com outras 500 crianças. Lançada em 2022, a plataforma já conta com 60 mil inscritos.

Cristina Christiano é jornalista com extensa carreira profissional, tendo atuado em diversos veículos impressos e audiovisuais nas áreas de polícia, justiça, saúde, educação, comportamento, urbanismo, direitos humanos, economia, entre outras. Fez diversas reportagens especiais, além de séries de repercussão e recebeu já vários prêmios por seu trabalho.