O Congresso Nacional se prepara para uma sessão decisiva na próxima terça-feira (17), quando deputados e senadores devem se debruçar sobre uma pauta densa, com temas de alta sensibilidade política e impacto direto na vida de milhões de brasileiros. Convocada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), a sessão conjunta tem como principal objetivo a análise de 60 vetos presidenciais assinados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), acumulados nos últimos meses, alguns deles pendentes desde 2023.
A reunião do Congresso será a primeira desde maio de 2024 e ocorrerá em um momento em que o clima político em Brasília tem se mostrado cada vez mais polarizado. Os vetos em questão abrangem uma variedade de temas, incluindo reforma tributária, programas sociais, saúde pública, transparência no serviço público, transição energética e segurança jurídica.
Além disso, há grande expectativa em torno da possível leitura do requerimento de criação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que visa investigar denúncias de fraudes envolvendo o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Apesar de o item ainda não constar oficialmente na ordem do dia, os bastidores indicam que a criação da comissão será tratada como prioridade.
Vetos impactam áreas cruciais da política pública
Entre os principais vetos que devem ser analisados, destacam-se aqueles que incidem sobre a reforma tributária, considerada uma das mais ambiciosas tentativas de reestruturação do sistema fiscal brasileiro nas últimas décadas. O governo vetou trechos da lei complementar que institui o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo (IS) este último apelidado de “imposto do pecado” por incidir sobre produtos como bebidas alcoólicas, cigarros e itens prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.
Outro ponto polêmico envolve o veto parcial à criação do Programa de Aceleração da Transição Energética (Paten), que tinha como objetivo impulsionar investimentos em fontes renováveis e descarbonizar a matriz energética do país. O Planalto justificou o veto com base em impactos orçamentários, mas ambientalistas e parlamentares engajados na pauta climática alegam que a decisão vai na contramão dos compromissos internacionais do Brasil.
Na área da saúde, o veto total à proposta que reconhece o diabetes tipo 1 como deficiência gerou forte reação de entidades médicas e de defesa dos direitos das pessoas com deficiência. O reconhecimento legal permitiria a esse grupo o acesso a políticas públicas específicas, como prioridade em concursos públicos, cotas e benefícios previdenciários.
Outro veto que promete mobilizar intensos debates é o que rejeita a concessão de indenização por dano moral e pensão especial a vítimas de microcefalia causada pelo vírus Zika. O projeto previa amparo a pessoas que desenvolveram deficiências permanentes por conta da infecção durante a epidemia registrada entre 2015 e 2017. Segundo o Executivo, o impacto financeiro da medida inviabilizaria sua implementação, o que foi criticado por parlamentares e familiares atingidos.
Também está na pauta o veto parcial à proposta que mantém o nome de condenados por pedofilia no Cadastro Nacional de Predadores Sexuais por até dez anos após o cumprimento da pena. O projeto, aprovado com ampla maioria nas duas Casas, busca fortalecer mecanismos de controle e prevenção de crimes sexuais, sobretudo contra crianças e adolescentes.
Um dos vetos mais controversos envolve um trecho da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que segundo críticos, poderia reduzir a transparência dos salários pagos a membros do Judiciário e do Ministério Público. O governo alegou que a manutenção da norma feria a autonomia dos poderes, mas deputados e senadores afirmam que a sociedade tem o direito de acessar essas informações, sobretudo diante da crescente cobrança por austeridade e responsabilidade fiscal.
Além dos vetos, o Congresso deve discutir dois projetos de lei e duas propostas de resolução. Entre os projetos, destaca-se um texto que propõe mudanças nas regras do Imposto de Renda para pessoas físicas, estabelecendo que futuras alterações na tabela passem a valer de forma permanente, sem o limite de cinco anos atualmente imposto pela legislação.
Entretanto, o texto inclui dois dispositivos paralelos conhecidos como “jabutis” que não têm relação direta com o conteúdo principal. Um deles vincula a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil mensais à ampliação do número de deputados federais, medida criticada por representar aumento de despesas com o Legislativo. O outro prevê a retomada de verbas do orçamento secreto que haviam sido bloqueadas ou canceladas pelo atual governo.
CPMI do INSS: pressão cresce para instalação da comissão
Enquanto os vetos dominam a pauta oficial, cresce a mobilização nos bastidores do Congresso pela instalação da CPMI do INSS, proposta que busca investigar fraudes e irregularidades em descontos aplicados indevidamente sobre os benefícios de aposentados e pensionistas.
Diversos beneficiários da Previdência têm relatado a existência de descontos não autorizados em seus contracheques, incluindo taxas por serviços financeiros, seguros, associações e “clubes de vantagens” que nunca foram solicitados. Em muitos casos, as vítimas são pessoas idosas, de baixa escolaridade, que sequer sabem que estão sendo prejudicadas.
O requerimento de criação da CPMI já foi assinado por 223 deputados e 36 senadores, ultrapassando o mínimo exigido. Desde 22 de maio, Alcolumbre vem pedindo aos líderes partidários que construam acordos para viabilizar não apenas a votação de todos os vetos, mas também a leitura oficial do pedido de abertura da comissão.
A expectativa é que a CPMI ajude a responsabilizar empresas financeiras, servidores públicos e sistemas de controle que permitiram esse tipo de fraude em um dos programas mais sensíveis do governo federal. Estima-se que os prejuízos aos cofres públicos e aos beneficiários já ultrapassam bilhões de reais.
As decisões que serão tomadas pelo Congresso na próxima terça-feira terão reflexos imediatos sobre o dia a dia dos brasileiros. A depender do resultado das votações, poderão ser destravadas políticas públicas de saúde, benefícios sociais e incentivos econômicos. Por outro lado, também podem ser mantidos vetos que barram a implementação de medidas com forte apelo social.
A leitura e eventual instalação da CPMI do INSS, se confirmada, pode iniciar uma série de audiências, depoimentos e apurações que mexerão com a estrutura do sistema previdenciário nacional. A população mais vulnerável, especialmente aposentados e pensionistas, estão aguardando com expectativa a atuação da comissão para que abusos sejam corrigidos e os responsáveis, punidos.
A sessão também servirá como termômetro da relação entre o Congresso e o Palácio do Planalto, revelando o nível de articulação política da base governista e o grau de independência das lideranças parlamentares diante de pautas impopulares ou controversas.
A terça-feira promete ser longa e estratégica para o futuro de projetos estruturais do país tanto na área fiscal quanto social e pode definir os rumos da política brasileira nos próximos meses.
Por Alemax Melo I Revisão: Daniela Gentil
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