A deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) passou a ser alvo de questionamentos em Brasília nesta terça-feira (24), após a divulgação de que dois de seus assessores parlamentares teriam, supostamente, atuação também como maquiadores profissionais. A contratação, embora esteja de acordo com as regras da Câmara dos Deputados, gerou duras críticas da oposição, especialmente do Partido Liberal (PL), que acusa a parlamentar de desvio de função e uso indevido de recursos públicos.
Os nomes dos profissionais são Ronaldo Cesar Camargo Hass e Índy Cunha Montiel da Rocha, ambos com histórico no ramo da beleza. Eles foram oficialmente nomeados como secretários parlamentares no gabinete da deputada em maio de 2024.
Segundo o Portal da Transparência da Câmara dos Deputados, Hass recebe R$9.678 mensais, enquanto Montiel recebe R$2.126. Apesar de constarem como assessores, os dois seguem utilizando suas redes sociais para divulgar trabalhos de maquiagem, com destaque para produções feitas por Erika Hilton.
A informação foi inicialmente divulgada pelo site Metrópoles e rapidamente repercutiu em Brasília. Parlamentares do PL, entre eles os deputados Paulo Bilynskyj (PL-SP) e Sanderson (PL-RS), protocolaram representações no Conselho de Ética da Câmara e também no Ministério Público Federal.


A oposição alega que os assessores não exercem, de fato, funções compatíveis com seus cargos e que estariam atuando como cabeleireiros e maquiadores pessoais da deputada, o que configura, segundo eles, uma afronta ao princípio da moralidade administrativa.
“É inaceitável que recursos públicos sejam usados para financiar serviços estéticos particulares”, afirmou o deputado Bilynskyj.
O também deputado Sanderson, em nota pública, acrescentou: “A parlamentar transformou seu gabinete em um camarim de luxo, enquanto o país enfrenta tantas necessidades urgentes”.
A Mesa Diretora da Câmara agora deverá avaliar se há elementos suficientes para que o caso seja encaminhado formalmente ao Conselho de Ética. Caso isso ocorra, Erika Hilton poderá ter que prestar esclarecimentos à Casa e poderá ser alvo de um processo por quebra de decoro parlamentar.
Defesa firme nas redes
Em suas redes sociais, Erika Hilton respondeu de forma contundente às acusações. Em nota publicada em seu perfil no Instagram, a deputada classificou as alegações como “mentirosas” e uma tentativa orquestrada de desqualificar seu mandato.
“Não, meus amores, eu não contrato maquiadores com verba de gabinete. Isso é uma invenção. Tenho dois secretários parlamentares que todos os dias estão comigo me assessorando em comissões, audiências, fazendo relatórios, preparando briefings, dialogando com a população e prestando um serviço incrível”, escreveu.
Segundo Erika, o fato de os assessores também serem maquiadores não os impede de desempenhar funções administrativas e legislativas.
A deputada afirma que ambos acompanham sua rotina em São Paulo, Brasília, viagens ao interior e até compromissos internacionais.
“Tudo é completamente comprovado por fotos, vídeos e pelo trabalho cotidiano deles”, completou a parlamentar.
Erika também levantou suspeitas de motivação política por trás da repercussão do caso. Ela relembrou que é autora de propostas polêmicas, como a PEC que visa reduzir a jornada de trabalho e acabar com a escala 6×1.
“Essa perseguição toda tem nome: misoginia, transfobia e medo de perder privilégios. A indigestão dessa gente comigo vai continuar crescendo. Que os explode por dentro. Porque aqui, eu e meu gabinete continuaremos trabalhando”, disparou.
Um mandato histórico
Erika Hilton está no primeiro mandato como deputada federal. Ela foi eleita em 2022, com 256.903 votos, sendo a sexta candidata mais votada do estado de São Paulo. Antes disso, ela já havia feito história ao se tornar a primeira vereadora trans eleita para a Câmara Municipal de São Paulo, em 2020.
A presença da deputada na Câmara dos Deputados representa um marco na luta por diversidade e inclusão, sendo a primeira mulher trans a ocupar uma cadeira no Congresso Nacional.
Limites legais e funções parlamentares
No Congresso Nacional, cada deputado federal tem direito a contratar até 25 assessores parlamentares, com salários que variam entre R$1.548,10 e R$18.719,88, desde que o valor total mensal não ultrapasse o teto de R$133.170,54.
O uso da verba para contratar esses profissionais é regulamentado pela Câmara, mas a atividade desenvolvida por cada assessor é, muitas vezes, interpretativa e fiscalizada apenas se houver denúncia.
Até o momento, Erika Hilton conta com 14 assessores formalmente registrados, entre eles os dois citados na polêmica.
A parlamentar não revelou quais funções específicas motivaram a contratação de Hass e Montiel, mas assegura que ambos têm formação e atuação compatíveis com os trabalhos exigidos no mandato.
Índy Montiel, que anteriormente usava o nome Rodrigo Cunha Montiel da Rocha, se apresenta nas redes como “beauty artist” e “fashion enthusiast”, além de assessor parlamentar.
Já Haas se define como artista focado em cabelo e maquiagem. Entre suas publicações, há registros da preparação de Erika para a Marcha Trans, o ensaio da escola de samba Paraíso do Tuiuti e outros eventos de relevância simbólica para o mandato da deputada.
O debate sobre decoro e identidade
Para aliados de Erika Hilton, a polêmica esconde um debate mais profundo sobre os limites do decoro parlamentar e os ataques recorrentes que a deputada, uma mulher trans e negra, sofre desde sua eleição.
“Estão tentando criminalizar a presença da diversidade dentro do Congresso. Querem fazer parecer que qualquer diferença é extravagância, quando na verdade é representatividade”, comentou uma colega do PSOL.
A bancada do PSOL na Câmara já se manifestou em apoio à deputada e classificou a iniciativa da oposição como “movida por preconceito e hipocrisia”. Em nota oficial, o partido afirma que Erika está sendo alvo de uma “tentativa de assassinato de reputação”.
Até o momento, não há decisão sobre o andamento do caso no Conselho de Ética, e o Ministério Público Federal também não se pronunciou oficialmente sobre a representação protocolada pelo PL.
Enquanto isso, Erika Hilton segue em sua agenda parlamentar e reafirma que continuará atuando com independência, sem se intimidar com o que classifica como “tentativas frustradas de desestabilizar um mandato combativo, plural e popular”.
Por Alemax Melo I Revisão: Redação
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