Uma pesquisa piloto inédita conduzida por cientistas da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) revelou a presença de microplásticos em placentas e cordões umbilicais de gestantes brasileiras.
Esta é a primeira investigação a identificar essa forma de contaminação no Brasil e o segundo estudo no mundo a comprovar a presença dessas partículas em cordões umbilicais. Os resultados foram publicados nesta sexta-feira (25), na revista Anais da Academia Brasileira de Ciências, com divulgação da Agência Bori.
Para este projeto-piloto, a equipe analisou amostras de 10 gestantes atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Hospital Universitário Professor Alberto Antunes e no Hospital da Mulher Dra. Nise da Silveira, ambos em Maceió, Alagoas. As amostras foram coletadas entre junho e outubro de 2023, após os partos.
Os tecidos foram submetidos a um processo de digestão com hidróxido de potássio por sete dias para remover a matéria viva, deixando apenas as micropartículas. Em seguida, as sobras foram filtradas e analisadas por espectroscopia Micro-Raman, uma técnica de alta precisão que identifica a composição química das partículas. O processo completo durou cerca de um ano devido à complexidade da filtração.
Achados preocupantes e materiais identificados
Como resultado, foram identificadas 229 partículas de microplásticos nas dez pacientes, sendo 110 nas placentas e 119 nos cordões umbilicais. O material mais encontrado foi o polietileno, presente em embalagens plásticas descartáveis, seguido pela poliamida, utilizada em tecidos sintéticos.
Um dos achados mais preocupantes foi a detecção de uma quantidade maior de microplásticos nos cordões umbilicais do que nas placentas em oito das dez amostras. O que indica que, apesar da placenta ser um eficiente filtro, as micropartículas de plástico podem chegar até os bebês durante seu desenvolvimento.
O grupo da Ufal também publicou um estudo com células e tecidos humanos mostrando que os plásticos de poliestireno passam facilmente pela barreira placentária e causam alterações no metabolismo dessa placenta e na produção de radicais livres, o que indica um possível efeito no desenvolvimento do bebê.
Implicações para os bebês e próximos passos da pesquisa
Ainda não é possível determinar efetivamente quais tipos de alterações os microplásticos podem gerar na formação e no desenvolvimento da criança.
A descoberta, no entanto, abre caminho para mais pesquisas nesta área. O grupo da Ufal pretende ampliar o estudo, aumentando a quantidade de amostras para 100 gestantes e testando diferentes populações. A expectativa é que esses resultados sejam publicados em 2027.
A pesquisa também se destaca por focar em uma população socioeconomicamente vulnerável, um grupo frequentemente ausente em estudos internacionais sobre o tema.
Contexto global e possíveis fontes de contaminação
Os achados sobre a presença de microplásticos em humanos ainda estão em fases iniciais. Um estudo anterior do mesmo grupo de pesquisadores, em parceria com a University of Hawai’i at Mānoa, publicado em 2023, já havia investigado a exposição à poluição por plásticos no Havaí, onde foi identificado um aumento significativo do acúmulo de microplásticos em placentas nos últimos 15 anos.
Nesse estudo, 6 de 10 placentas tinham plásticos no primeiro levantamento, mas em 2021, todas apresentaram. Embora todas as amostras brasileiras estivessem contaminadas, elas apresentaram menos aditivos químicos associados aos polímeros plásticos do que as amostras norte-americanas.
Outros estudos populacionais em países como Itália, Alemanha, República Tcheca, China, Irã, EUA e Canadá também observaram a correlação entre fatores geográficos e a presença de microplásticos em placentas. Um estudo americano pré-publicado — ainda sem revisão de pares — relaciona a exposição a microplásticos a nascimentos prematuros.
A contaminação por microplásticos ocorre predominantemente por ingestão (através da água e alimentos), pela inalação de ar contaminado e pela absorção através da pele por meio de produtos cosméticos.
Em Alagoas, o pesquisador Alexandre Urban Borbely acredita que a poluição marinha tem uma grande contribuição, já que a população local consome muitos peixes e frutos do mar, incluindo moluscos filtradores. Outra fonte importante mencionada é a água mineral engarrafada, que pode adquirir partículas de forma acelerada quando os galões são expostos à luz solar.
Alerta coletivo e necessidade de regulamentação
O estudo acende um alerta, e as ações individuais são pouco efetivas para evitar a contaminação. Há urgência de regulamentação no uso e descarte do plástico no Brasil, ação que depende de intervenção do governo.
A pesquisa destaca a urgência do monitoramento da contaminação por plástico em água e alimentos. As partículas atravessam a barreira placentária e chegam até o feto, e isso levanta dúvidas sobre os possíveis impactos no desenvolvimento gestacional e na saúde futura da criança.
Por: Iamara Lopes | Revisão: Redação
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