A partir deste sábado (1º), entram em vigor as novas normas que restringem as antecipações do saque-aniversário do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço). As mudanças alteram o funcionamento da modalidade, impondo limites à quantidade de operações, ao valor máximo das antecipações e ao prazo mínimo para realizá-las.
Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), as alterações devem devolver cerca de R$ 84,6 bilhões que, até 2030, iriam para instituições financeiras. O objetivo, segundo a pasta, é garantir que o dinheiro permaneça mais tempo nas contas dos trabalhadores e no próprio fundo, fortalecendo sua função social e econômica.
O que muda com as novas regras
Até agora, o trabalhador que optava pelo saque-aniversário podia antecipar o valor de forma quase imediata em alguns casos, no mesmo dia da adesão. Com as novas normas, será necessário aguardar pelo menos 90 dias após a adesão ao regime para solicitar a primeira antecipação.
Além disso, as operações de crédito ficam mais restritas: será permitida apenas uma operação simultânea por ano. Antes, o número de antecipações era definido livremente por cada instituição financeira.
O Conselho Curador do FGTS fixou um novo limite: o trabalhador poderá antecipar até cinco saques-aniversário dentro de um período de 12 meses. Depois desse prazo, será possível realizar até três novas antecipações a cada ano subsequente.
O governo também estabeleceu valores mínimos e máximos para as operações: o trabalhador poderá antecipar de R$ 100 a R$ 500 por saque-aniversário, com limite anual de R$ 2.500.
Entenda o saque-aniversário
O saque-aniversário é uma modalidade criada em 2019 que permite ao trabalhador retirar uma parcela do saldo do FGTS todos os anos, no mês do seu aniversário. Em contrapartida, quem opta por essa modalidade perde o direito ao saque integral do saldo da conta em caso de demissão sem justa causa recebendo apenas a multa rescisória de 40%.
A medida foi implementada com o objetivo de dar maior liberdade ao trabalhador sobre o uso dos recursos do FGTS. Porém, desde o início, gerou controvérsias entre especialistas, sindicatos e o próprio governo atual.
Um volume bilionário de antecipações
Desde que foi criada, a modalidade movimentou cifras expressivas. Entre 2020 e 2025, mais de R$ 236 bilhões foram antecipados via saque-aniversário, segundo dados oficiais. Atualmente, 21,5 milhões de trabalhadores aderiram à modalidade.
Desses, cerca de 70% realizaram operações de alienação de crédito, ou seja, anteciparam valores do saque-aniversário junto a instituições financeiras. Esse mecanismo permite que o trabalhador receba de forma adiantada parcelas futuras do FGTS, funcionando na prática como uma espécie de empréstimo com desconto direto no saldo do fundo.
Para os bancos e financeiras, o produto se tornou um nicho rentável, uma vez que o risco de inadimplência é praticamente nulo e o pagamento é garantido pelo próprio saldo do FGTS.
“Armadilha para o trabalhador”, diz ministro
Marinho também argumenta que o mecanismo enfraquece o FGTS como fundo de investimento usado em obras de habitação popular, saneamento básico e infraestrutura urbana.
“O saque-aniversário enfraquece o Fundo tanto como poupança do trabalhador quanto como instrumento de investimento”, afirmou o ministro.
O governo ainda avalia se deve manter a modalidade a longo prazo. Nos bastidores, há técnicos defendendo uma reformulação completa, com foco em estimular o crédito consignado e ampliar alternativas de financiamento mais sustentáveis.
O papel do Conselho Curador
As novas regras foram definidas pelo Conselho Curador do FGTS, órgão tripartite composto por representantes do governo, dos empregadores e dos trabalhadores. O colegiado tem como função principal estabelecer políticas de aplicação e uso dos recursos do fundo.
O grupo vem discutindo, desde 2023, formas de conter o avanço das antecipações, que vinham retirando recursos do FGTS em ritmo acelerado. Parte dos conselheiros alertava para o risco de o fundo perder liquidez, ou seja, capacidade de financiar programas sociais e habitacionais.
A nova resolução foi aprovada por ampla maioria, com apoio tanto de representantes do governo quanto de entidades sindicais.
Possibilidade de crédito consignado com o FGTS
Enquanto restringe as antecipações, o Comitê Gestor do Crédito do Trabalhador analisa novas alternativas para ampliar o acesso ao crédito em condições mais seguras.
Uma das propostas em estudo prevê a criação de uma linha de crédito consignado usando até 10% do saldo do FGTS como garantia. A medida permitiria que o trabalhador contratasse empréstimos com taxas de juros mais baixas, sem comprometer totalmente o fundo.
Essa alternativa é vista pelo governo como mais vantajosa do que a antecipação do saque-aniversário, por manter a integridade do saldo e permitir que o trabalhador tenha mais flexibilidade financeira em casos de emergência.
Reações do setor financeiro
As novas restrições foram recebidas com cautela pelo setor financeiro. Bancos e fintechs que operam com o produto afirmam que as mudanças podem reduzir a atratividade das operações, impactando a oferta de crédito para pessoas físicas.
Por outro lado, especialistas em finanças pessoais avaliam que as medidas podem proteger o trabalhador de endividamentos desnecessários. Em muitos casos, as antecipações eram contratadas em momentos de dificuldade financeira, resultando em compromissos de longo prazo e pouca margem de manobra em situações de desemprego.
Impactos esperados
O governo acredita que, com as novas regras, haverá uma redução gradual das antecipações e um aumento do saldo médio retido no FGTS. Isso, segundo o MTE, permitirá maior volume de investimentos públicos e privados por meio do fundo, especialmente em habitação e infraestrutura.
Além disso, o retorno de R$ 84,6 bilhões aos trabalhadores até 2030 reforça o discurso de que o FGTS deve ser preservado como um patrimônio coletivo, e não apenas como instrumento de crédito.
Para os trabalhadores que já possuem contratos de antecipação vigentes, nada muda: as novas regras valem apenas para operações firmadas a partir de novembro.
Como fica para o trabalhador
Quem ainda pretende aderir ao saque-aniversário deve estar atento aos novos prazos e limites. Após optar pela modalidade, o trabalhador precisa aguardar três meses para realizar a primeira antecipação e só poderá contratar uma operação ativa por ano.
Os interessados também devem avaliar se a antecipação realmente compensa. Com o teto de R$ 500 por saque-aniversário, o benefício pode não ser suficiente para cobrir despesas emergenciais maiores e ainda reduz o saldo disponível no futuro.
Por outro lado, quem optar por não antecipar mantém o direito de sacar anualmente uma parte do saldo, conforme a tabela percentual do FGTS, sem comprometer o restante.
O futuro do saque-aniversário
A discussão sobre o futuro do saque-aniversário ainda está longe de acabar. Enquanto o governo avalia possíveis substituições e novas formas de crédito, parte do setor privado defende a manutenção da modalidade como opção de liberdade financeira.
Independentemente do desfecho, o consenso entre especialistas é que as novas normas representam um movimento de reequilíbrio: tentam proteger o trabalhador de armadilhas financeiras, sem extinguir completamente o mecanismo que, para muitos, foi uma alternativa importante de acesso a recursos durante os anos de crise.
Por Alemax Melo I Revisão: Daniela Gentil
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