As influenciadoras Kerollen e Nancy, que juntas têm mais de 13 milhões de seguidores, divulgaram imagens em que Kerollen conversa com um menino negro em uma calçada e oferece R$ 10 ou um presente. Ele escolheu o presente, que era uma banana, e demonstrou descontentamento. Em outro vídeo, Kerollen aborda uma menina, oferecendo R$ 5 ou uma caixa, que continha um macaco de pelúcia. A garota aparentou felicidade, abraçou o brinquedo e agradeceu. Segundo a Polícia Civil, o mesmo menino já havia sido abordado anteriormente pela influenciadora.
As influenciadoras digitais Kérollen Vitoria Cunha Ferreira e sua filha, Nancy Gonçalves Cunha Ferreira, foram condenadas nesta segunda-feira (19) a 12 anos de prisão em regime fechado por injúria racial. Os crimes foram cometidos em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, em 2023, contra duas crianças negras, de 9 e 10 anos, citadas acima.
A sentença foi proferida pela juíza Simone de Faria Ferraz, da 1ª Vara Criminal da Comarca de São Gonçalo, que classificou os atos como uma “monstruosidade”. Segundo a magistrada, as influenciadoras não postaram uma “inocente brincadeirinha”:
A juíza Simone de Faria Ferraz afirmou que Nancy e Kérollen criaram conteúdo ridicularizando as crianças. Segundo ela, pouco importa se, no momento em que receberam a banana e o macaco de pelúcia, não tinham plena consciência do impacto de seus atos:
“Não, o crime se protrai no tempo e ganha contornos de verdadeira monstruosidade quando publicam, sem dó e respeito, suas reações imaturas e inocentes em rede social. Destaco que o momento em que se dá a consumação é justamente após as postagens, com a extrema divulgação, nesse momento é que, após cientes das ofensas, as crianças são vitimadas.”
Em depoimento, Nancy e Kérollen alegaram que ajudavam as famílias das crianças e disseram ter seguido uma “trend” das redes sociais. Negaram ser racistas e afirmaram não saber o que é racismo recreativo. A juíza, no entanto, destacou:
“Nada mais absurdo querer fazer crer que nesses dias de conhecimento imediato, fácil acesso, as rés não soubessem o que é racismo. Não viviam as rés em tribo isolada, sem rede social, longe de tudo e de todos, absortas em si. Não e não! Faziam seu ganha-pão, nada módico, é bom de ver, justamente em publicações em rede mundial de computadores.”
Simone reforçou ainda:
“O que fizeram as rés, em íntimo de vontades, foi sangrar, mais uma vez, em açoites, os nascidos de África. Ao fazer jocoso o anseio de crianças entregando-lhes banana ou macaquinho de pelúcia, animalizando-as para além do humano, riram de suas opções cegas, em verdade sem escolha. Pior, ao afirmarem que nada fizeram, que ao outro cabia a culpa da disseminação do ódio, lavaram as mãos, brancas, como senhores de engenho antes de cada taça de vinho. E, é nessa esteira de ódio e dor que não há cabida para minorar os efeitos de tamanho racismo.”
Além da prisão, Nancy e Kérollen foram condenadas a pagar R$ 20 mil de indenização para cada uma das vítimas.

📌 Entenda: Racismo e racismo recreativo no Brasil
- O que é racismo?
Trata-se de qualquer conduta que inferiorize, segregue ou negue direitos em razão da cor da pele, etnia ou origem. No Brasil, é considerado crime inafiançável e imprescritível, previsto na Constituição de 1988. - Quando virou lei?
A Lei nº 7.716/1989 (Lei Caó) tipificou os crimes resultantes de preconceito de raça ou cor. Mais tarde, a Lei nº 9.459/1997 incluiu etnia, religião e procedência nacional, e a Lei nº 14.532/2023 equiparou a injúria racial ao crime de racismo. - Racismo recreativo
Conceito desenvolvido pelo jurista Adilson Moreira, refere-se a práticas racistas mascaradas de “piadas” ou “brincadeiras”. Exemplo: associar pessoas negras a animais ou objetos pejorativos. Embora disfarçado de humor, é crime e pode ser enquadrado como injúria racial ou racismo.
Por Kátia Gomes, com colaboração e revisão da Redação MD News
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