A Polícia Federal prendeu, nesta sexta-feira (13), o ex-ministro do Turismo do governo Bolsonaro, Gilson Machado, sob a acusação de tentar viabilizar um passaporte português para Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro. A ação da PF foi confirmada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e ocorreu no âmbito das investigações que cercam o núcleo político-militar envolvido nas tentativas de subversão da ordem democrática no Brasil.
A suspeita central é de que Machado teria atuado junto ao Consulado de Portugal em Recife, em maio deste ano, para obter ilegalmente a documentação europeia que permitiria a Mauro Cid deixar o Brasil, em meio às investigações que o apontam como peça-chave nos inquéritos conduzidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Figura próxima de Jair Bolsonaro, Gilson Machado ganhou notoriedade pública durante a pandemia, quando participava das transmissões ao vivo do então presidente, tocando sanfona. Sua atuação como ministro do Turismo foi marcada pelo alinhamento ideológico com Bolsonaro e por discursos inflamados contra a imprensa, as vacinas e o Judiciário.
Segundo a Polícia Federal, ele tentou interceder diretamente junto ao consulado português na capital pernambucana para garantir um passaporte europeu ao ex-ajudante de ordens do ex-presidente. A estratégia, segundo investigadores, visava garantir a saída de Cid do país, levantando suspeitas sobre uma possível fuga para escapar da Justiça brasileira.
Apesar de negar publicamente envolvimento, Machado admitiu ter feito um telefonema ao consulado em maio, mas alegou que a ligação foi feita apenas para agendar a renovação do passaporte de seu pai. A versão, contudo, é contestada pela Polícia Federal com base em depoimentos e registros telefônicos que ligariam o ex-ministro diretamente à tentativa de obtenção do documento para Cid.
Paralelamente à prisão de Machado, a PF cumpriu mandados de busca e apreensão na residência de Mauro Cid, em Brasília. Segundo a Folha de S. Paulo, os policiais chegaram a portar um mandado de prisão, mas foram informados, no local, que a ordem havia sido revogada por decisão do ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito das milícias digitais no STF.
A movimentação foi interpretada como um sinal de que Cid ainda está sob estreita vigilância da Justiça, mesmo após firmar acordo de delação premiada em setembro de 2023. O militar, que chegou a ser preso por envolvimento na falsificação de cartões de vacinação de Bolsonaro e seus familiares, comprometeu-se a colaborar com as autoridades em troca de benefícios legais, incluindo a liberdade provisória.
A trajetória de Mauro Cid é marcada por reviravoltas. Após ser preso em maio de 2023, passou a colaborar com as autoridades e revelou detalhes que alimentaram as investigações sobre tentativas de golpe de Estado, falsificação de documentos públicos, desvio de jóias da Presidência e esquemas de desinformação.
Em março de 2024, sua delação quase foi anulada quando áudios vazados pela revista Veja mostraram o militar acusando a Polícia Federal de pressioná-lo a implicar outros integrantes da cúpula bolsonarista. O episódio culminou em nova prisão por obstrução de Justiça. Após retratação e novo depoimento ao STF, Cid foi libertado, mas voltou a ficar sob forte vigilância.
Em novembro, o acordo de colaboração voltou a balançar. A Polícia Federal entregou um relatório que indicava omissões relevantes por parte de Cid, especialmente em relação ao plano conhecido como “Punhal Verde”, que envolvia um grupo interno do bolsonarismo radical chamado informalmente de “kids pretos” apontados como operadores digitais de ações coordenadas contra o regime democrático.
Diante disso, Moraes convocou Cid mais uma vez, advertindo que aquela seria sua “última chance” para ser transparente. O ministro chegou a ameaçar nova prisão, caso fossem detectadas novas omissões.
O envolvimento de Gilson Machado em uma possível tentativa de fuga internacional reacende preocupações sobre uma rede de apoio paralela, estruturada por aliados do ex-presidente, com o objetivo de blindar testemunhas, destruir provas ou articular estratégias de obstrução de Justiça.
O passaporte português, se fosse obtido, poderia facilitar a entrada de Mauro Cid em território europeu dificultando qualquer ordem de extradição futura, dada a morosidade e complexidade dos trâmites legais entre os países.
Ainda não se sabe se Cid chegou a ser informado da tentativa de obtenção do documento. Fontes da PF ouvidas sob sigilo afirmam que a prisão de Gilson Machado visa justamente impedir que novos passos sejam dados nesse suposto plano de fuga.
Até o fechamento desta reportagem, o ex-presidente Jair Bolsonaro não havia se pronunciado oficialmente sobre a prisão de seu ex-ministro. A defesa de Gilson Machado também não emitiu nota pública, e a Embaixada de Portugal no Brasil afirmou que colabora plenamente com as autoridades brasileiras, mas não pode comentar casos específicos por se tratar de dados protegidos por sigilo diplomático.
A investigação segue sob relatoria de Alexandre de Moraes no Supremo Tribunal Federal, e novas medidas cautelares podem ser decretadas a qualquer momento, a depender do avanço das investigações sobre a suposta tentativa de evasão de Mauro Cid.
Por Alemax Melo I Revisão Daniela Gentil
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