José “Pepe” Mujica, ex-presidente do Uruguai e uma das figuras políticas mais autênticas da América Latina, morreu nesta terça-feira (13), aos 89 anos. Ele estava em cuidados paliativos, após ser diagnosticado com um câncer no esôfago em 2024. Mujica também convivia com uma doença autoimune que afetava seus rins.
De guerrilheiro a presidente do Uruguai
Filho de pequenos agricultores, nascido em Montevidéu, Mujica passou a juventude entre o campo e os livros. Ainda jovem, entrou para a militância estudantil e, por volta dos 30 anos, optou por radicalizar suas ações ao integrar o movimento guerrilheiro Tupamaros. Por sua atuação política, foi preso três vezes, e passou 13 anos na prisão durante a ditadura militar uruguaia, boa parte em solitária, sem acesso a livros, luz solar ou alimentação adequada.
Sobreviveu a torturas, doenças e até a seis tiros da polícia. “Ficava feliz toda vez que conseguia beber um copo d’água ou dormir em um colchão”, lembrou anos depois. Em confinamento, chegou a comer sabão, papel higiênico e moscas. Teve alucinações, perdeu dentes por conta das surras e tornou-se paciente psiquiátrico no Hospital Militar de Montevidéu.
Libertado com a anistia de 1985, Mujica não só voltou à vida pública, como foi fundamental para o processo de redemocratização do país. Abandonou a luta armada e mergulhou na política institucional. Foi deputado, senador, ministro da Pecuária e, em 2010, chegou à Presidência da República.
Como chefe de Estado, governou com a mesma humildade com que viveu: abriu mão da residência oficial, doava parte do salário e continuava morando em sua chácara, dirigindo um Fusca azul. Defendeu a legalização do aborto, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a regulação da maconha, colocando o Uruguai na vanguarda progressista do continente.
Em outubro de 2023, já enfrentando problemas de saúde, concedeu uma de suas últimas entrevistas ao jornal El País. Em tom sereno, falou sobre o fim da vida: “Eu me dediquei a mudar o mundo e não mudei p* nenhuma, mas estive entretido. E gerei muitos amigos e muitos aliados nessa loucura. Dei um sentido à minha vida. Vou morrer feliz. Não por morrer, mas por deixar uma marca que me supera com vantagem.”
Na última segunda-feira, 12, a esposa do político uruguaio, Lucía Topolansky, afirmou que ele está em estado terminal e recebendo cuidados paliativos. “Os médicos estão tentando fazer isso da melhor maneira que puderem, mantendo-o sem dor, capaz de dormir e sem ansiedade”, explicou a senadora.
Ao longo de sua trajetória, José “Pepe” Mujica ficou conhecido mundialmente como “o presidente mais pobre do mundo”, por levar uma vida simples e dirigir o mesmo fusca azul por anos. Recebeu uma oferta de US$ 1 milhão (cerca de R$ 2,5 milhões) pelo veículo, mas recusou. “Enquanto eu estiver vivo, não vendo”, respondeu.
Por Aline Feitosa | Revisão: Daniela Gentil
