Desde que chegou, a inteligência artificial causa estranheza e desconfiança entre os usuários. Já no jornalismo ela é vista como uma ferramenta impulsionadora das redações e carreira dos jornalistas, e também para a maioria dos adeptos em geral. Lógico que há quem utilize de forma nada ética e com fins de plágio, mas esses casos acabam sempre sendo descobertos e as empresas e profissionais desmoralizados. Me peguei conversando com um amigo, o Carlos Eduardo, que trabalha em uma empresa de tecnologia para grandes bancos sobre o tema. Ele me disse: “Transcrever o que a IA faz é plágio e isso não deve ser feito jamais pelo jornalista, ou então seria melhor dar os créditos do conteúdo para a IA”.
Além do plágio, é importante o cuidado ao compartilhar informações com a inteligência artificial. Qualquer documento compartilhado para ensiná-la a te ajudar em alguma coisa pode ser desastroso quando se quer proteger a identidade de alguém ou alguma informação sigilosa. Usar textos de jornalistas e veículos que apuraram as informações e pedir para a IA transcrevê-los também é um exemplo de plágio e uma forma de enganar o leitor e pode manchar a reputação de um veículo e a carreira de um profissional. Um bom caso para tirarmos como exemplo é o da revista de esportes americana Sports Illustrated que esteve envolvida em um escândalo sobre a utilização de IA em sua redação e culminou na demissão do CEO. O veículo foi acusado de utilizar autores fictícios na publicação de textos gerados por IA e depois transmitir a responsabilidade a empresa de publicidade terceirizada, enfim, é uma batata quente que ninguém quer segurar, passa para o colega do lado.
A utilização nas redações
Muitas redações identificaram uma demanda interna para criar a sua própria IA, para compartilhar informações internas e para desenvolvimento dos trabalhos das equipes. A política de que nada deve substituir o trabalho humano é um norte para a boa política de utilização da IA como ferramenta na Núcleo Jornalismo, por exemplo. “A IA é uma ferramenta e não uma força de trabalho por si só”– Jade Drummond , diretora de operações na Núcleo Jornalismo.
O Estadão, por sua vez, quando identificou a necessidade de criar uma Inteligência Artificial própria, a “Leia”, iniciou imediatamente a discussão sobre uma política de utilização da ferramenta, tendo em vista a preocupação com a utilização ética e responsável desse recurso dentro de sua redação. “A gente tem sempre que ter transparência com o leitor, então se a gente for usar a IA, vai tá sempre lá sinalizado no pé da matéria(…)”– Bruno Romani, editor na editoria de tecnologia e informação do Estadão.
“A IA não deve ser utilizada como fonte primária de pesquisa. Ela não foi feita para ser precisa no conteúdo mas sim na forma” – Bruno Romani, Estadão.
A IA pode ser um malefício?
De acordo com estudo da Microsoft a IA pode afetar o pensamento crítico de uma pessoa, interferindo em seu desempenho profissional. Acho que esse é o ponto que deve ser verificado. Onde é o limite? Onde começa o risco? Como evitar perder essa criticidade que é indispensável para um jornalista?
Mas o que é o pensamento crítico?
O pensamento crítico é a capacidade de um indivíduo de realizar julgamentos sobre algo e de chegar a uma conclusão com base nas informações observadas. Uma pessoa que possui pensamento crítico tem maior capacidade de argumentar, tomar decisões, articular argumentos, resolver problemas e muitas outras características.
O pensamento crítico é uma capacidade que pode ser adquirida durante a vida ou resgatada, mas requer disciplina e foco. Alguma dicas são:
- Realizar a gestão do tempo: Boas formas disso são parar de rolar a tela do celular em redes sociais sem propósito definido. Se não fizer isso pode se dar conta que perdeu 40 minutos de seu tempo que poderia ser investido na leitura de um artigo por exemplo e agregar valor para si mesmo com conhecimento de qualidade. Ao organizar seu tempo vai verificar que todas as tarefas que outrora nunca saíram do papel serão enfim concluídas.
- Escrever para aprender a pensar: “Se você pode pensar, falar e escrever, você pode ser absolutamente letal”. – Jordan Peterson. A escrita tem essa capacidade de envolver o indivíduo na reflexão sobre os textos que foram escritos, gerando a autocriticidade. Por isso é tão importante escrever; se possível tenha sempre um bloco para anotações.
- Seja curioso e questionador: Busque a definição de termos e expressões utilizadas. Não seja uma dessas pessoas que só saem repetindo o que os outros dizem sem entender o real significado, pois, quando for questionado, ficará evidente que você não conhece o que argumenta. Um exemplo disso é um relato da economista Patrícia Lages. “Outro dia aí uma pessoa chamou um político de facista, ai eu perguntei pra ela, o que é facista? Sabe o que aconteceu? A pessoa não sabia o que era o significado da palavra. E ao invés de cair na real, a pessoa achou que eu estava defendendo o político”. Aqui podemos perceber que a falta do pensamento crítico pode nos colocar em verdadeiras mesa de sinuca e nos fazer passar vergonha.
No entanto, a principal conclusão do estudo é que “uma das grandes ironias da automação é que, ao mecanizar tarefas rotineiras e deixar a resolução de exceções para o usuário, você o priva das oportunidades diárias de praticar seu julgamento e fortalecer sua capacidade cognitiva, tornando-o atrofiado e despreparado para as exceções”, explicam os pesquisadores.
Tendo em vista que devemos tomar cuidado para não fazer da IA uma muleta e sim uma ferramenta para auxílio pontual, podemos partir para outro ponto, as ferramentas indispensáveis no dia a dia do jornalista para um conteúdo de confiança e excelência, levando em consideração a ética e o bom senso.
IA e checagem de fatos
A checagem e apuração dos fatos para a notícia deve ser uma prioridade; não queremos repetir o famoso e fatídico caso da Escola Base, não é mesmo? Para isso devemos checar, apurar todos os fatos e não sair propagando fake news baseadas em suposições. Para quem não lembra a Escola Base, era uma escola de ensino infantil da Zona Norte que foi alvo de investigações e acusação de abuso sexual pela mae de uma das crianças.
O caso foi conduzido de maneira equivocada, com base no relato da criança e posteriormente laudos não puderam confirmar o abuso. O resultado é que a vida daquelas pessoas foram destruídas por mera irresponsabilidade dos veículos de comunicação, alguns mais pra frente se retrataram, mas isso não pôde desfazer o prejuízo que as pessoas acusadas tiveram, em suas vidas social e financeira.
A checagem dos fatos não podem ser desprezadas jamais. Veículos de comunicação de renome aderiram a equipes de checagem de fatos para transparência com a população. Vamos ver alguns: UOL Conference/ Folha Verifica, G1 Fato Ou Fake.
Afinal, IA é ajuda ou ameaça?
Depende de cada um de nós. A IA só existe porque os humanos a criaram, sabem o que as pessoas compartilham. Levar uma vida saudável com IA só é possível se entendermos que o toque humano é único e jamais poderá ser substituído. Tudo pode ser remodelado, a maneira de realizar as coisas, mais automação acontecendo, mas usar a IA como apoio, como ferramenta é o ponto importante para não nos perder da nossa identidade, do que somos. Olhar pra dentro e entender que independente de ter a IA precisamos continuar nos desenvolvendo como profissionais e como pessoas, afinal, legado só uma pessoa consegue deixar.
Acredito que a IA só é uma ameaça a partir do momento em que nós damos esse poder a ela. Perdendo a oportunidade de criar algo único por preguiça de construir um conteúdo de valor, transferindo isso 100% para a IA, ou mesmo perdendo um tempo infinito e precioso em redes sociais sem nenhum propósito ao invés de passar um tempo de qualidade com a família ou investindo na leitura de um bom livro, em uma palestra, e em coisas que realmente são significativas e frutíferas para nossas vidas pessoais e profissionais, e como jornalista, perdendo a capacidade de cumprir seu propósito, levar informação para ajudar as pessoas.
*As informações contidas neste texto são de responsabilidade dos colunistas e não expressam necessariamente a opinião do Portal Márcia Dantas News.
Por: Daniela Gentil | Revisão: André Silveira Guéli